domingo, 17 de fevereiro de 2013

A propósito da retirada das crianças e da polémica em torno da laqueação de trompas (3)

Esta situação veio levantar uma série de questões que importa reflectir e dissecar, de uma forma distanciada e neutral, procurando as razões deste desfecho na salvaguarda (ou não) do superior interesse da(s) criança(s). Assim:

1) A laqueação das trompas é um acto que, per si, não deve ser nunca imposto compulsivamente a uma progenitora. Deve ser discutido e aconselhado com a mesma, persuadindo-a a tomar este passo, caso se justifique este procedimento. Em lado nenhum se afirma que esta era uma medida incluída numa cláusula do Acordo de Promoção e Protecção (APP) levado a cabo entre progenitores e CPCJ, mas o contrário também nunca foi cabalmente desmentido.
2) Os prazos de intervenção também devem ser escrupulosamente cumpridos, no intuito de erradicar as situações de perigo em que crianças ou jovens se encontrem, de acordo com o artigo 4º, alínea c) (intervenção precoce) da lei 147/99 pelas quais as CPCJs se regem. Um processo, numa CPCJ, nunca deve exceder os 18 meses. Ora, tendo este processo sido sinalizado em 2007 (existem referências da escola já em 2005!!!), como se explica que todo este imbróglio se tenha arrastado quase 8 anos?
3) Uma das diligências comuns nestas situações prende-se com a realização de uma visita domiciliária à casa da ou das crianças sinalizadas. Havendo indícios graves de negligência, não deveriam ter sido desencadeadas medidas mais céleres e urgentes para fazer face às acusações que sobre esta mãe pendiam? (E eis o espanto quando a reportagem da SIC desmente categoricamente a falta de condições habitacionais embora estas se reportem à data presente). E qual foi o papel da escola neste processo? Agiu em conformidade? Deixou este processo arrastar-se pelo menos dois anos sem ter feito nada ou ter articulado activamente com a CPCJ?
4) Um dos pontos fundamentais para que um APP seja coroado de êxito é a consciencialização dos progenitores e menores para o seu cumprimento e o esclarecimento pleno no que o mesmo consiste e qual é o seu âmbito e penalizações em caso de incumprimento. No que diz respeito a este tópico, pareceu-me flagrante, pelas afirmações proferidas pela mãe, que esta não tinha qualquer noção do que assinava e qual era o objectivo daquele acordo e do que incorria caso não cumprisse. Considero fundamental, sublinho novamente, que os pais não só entendam aquilo em que se comprometem, mas também que os técnicos das CPCJs elucidem cabalmente os princípios orientadores de um APP, sob o risco de este ser votado ao fracasso.
5) Se o ponto relativo à laqueação de trompas poderá não ter constado no APP lavrado pela CPCJ, parece-me evidente que o assunto não é omisso no acordo celebrado entre tribunal e os progenitores. Sendo esta uma decisão pessoal e um direito inalienável do qual a mãe só deverá abdicar por opção, não considero que fosse esta a melhor forma de gerir a situação prevendo-se, em situações análogas, procedimentos ou estratégias menos drásticas. Também aqui houve uma flagrante falta de articulação entre escola/centro de saúde e Segurança Social e entre esta e o tribunal. (O processo arrastou-se em Tribunal entre 2009 e 2012!!!).
6) O último tópico de reflexão prende-se com a decisão de enviar para adopção os seus sete filhos mais novos. Refere-se, segundo o relatório elaborado pela Segurança Social local, que não existiam sinais de maus tratos verificando-se um vínculo afectivo e familiar sólido.
Parece-me excessiva a decisão destas crianças virem a ser imediatamente adoptadas. Se fossem institucionalizadas e a mãe procedesse, num razoável espaço de tempo, à reorganização das suas tarefas domésticas, a uma maior responsabilização parental por parte das entidades competentes, poderia existir a possibilidade de os mesmos voltarem para o seio do seu lar.
No entanto, diz-me a experiência, que a quebra dos vínculos afectivos são, em muitas circunstâncias, um mal necessário e que o nosso idealismo choca com práticas quotidianas criticáveis e negligentes. Contra factos não há argumentos. A questão que se coloca, e à qual nem eu ouso responder, é:
- Não teria esta mãe, perante tudo o que ocorreu, o direito a uma segunda oportunidade?
- Terá sido esta mãe a pessoa mais negligente em todo este drama humano?

Óscar Hilário







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