Tito de Morais, responsável pelo projecto MiudosSegurosNa.Net, num comentário ao PÚBLICO sobre o caso de Amanda, salienta a ironia de o Canadá ser dos países onde o tema é mais trabalhado e um dos países onde nasceu o conceito.
Este especialista no aconselhamento sobre o tema ressalva, contudo, que “este tipo de desfechos devem ser enquadrados e que quando há suicídio normalmente o ciberbullying é mais um elemento que se vai juntar a outros tantos”. Recorda que a adolescente tinha um contexto familiar complicado e que a idade de transição em que se encontrava é das mais difíceis de gerir.
Ainda assim, para Tito de Morais o caso de Amanda é um “exemplo extremo” das consequências deste tipo de violência. Sobre a situação de Portugal, refere que casos tão limite não são comuns e que o bullying sexual tem menos expressão que outras formas de pressão. Além disso, é mais comum este tipo de violência ser feita entre pares e não entre um adulto (como se suspeita) e uma criança.
Tito de Morais insiste que legislar é importante, mas que por si só nada resolve. “É preciso educar e sensibilizar e ter uma abordagem holística do problema que passe pela prevenção”. Por isso, deixa alguns conselhos aos pais como antecipar os problemas e falar com os filhos mal têm os primeiros contactos com a Internet. “Reportar a intimidade em formatos digitais é o primeiro passo para perdermos o controlo sobre eles”, alerta.
Também Luís Fernandes, autor juntamente com Sónia Seixas do livro Plano Bullying - Como apagar o bullying da escola (Editora Plátano), que está prestes a ser lançado, destaca que o tipo de bullying de que Amanda foi alvo “é o mais perigoso de todos porque é espalhado pelas novas tecnologias de forma camuflada” e não corresponde à tipologia habitual, já que não terá acontecido entre pares.O psicólogo educacional defende “uma intervenção global” perante este problema, mas alerta que o mais comum é a vítima sofrer em silêncio, sem pais e professores se aperceberem. Perante a exposição de que Amanda foi alvo, Luís Fernandes considera que os professores e os pais deveriam ter trabalhado mais em conjunto as mudanças de escola, para prevenir a progressão do problema.
“Os sinais como a automutilação não foram entendidos pela comunidade e por isso não se evitou o desfecho. O problema do ciberbullying é a rapidez com que as coisas evoluem e a rapidez com que algo divulgado é visto”, acrescenta, dizendo, contudo, que muitas vezes até o próprio agressor não tem consciência da dimensão do que está a criar.
Pensamentos suicidas são comuns
O tema do bullying é cada vez mais referido e em 2011 um pai de uma vítima escreveu mesmo um livro sobre o assunto, no qual alerta que as crianças persistentemente maltratadas e com depressões durante um período de tempo significativo poderão experimentar pensamentos suicidas. “Proteja o seu filho do Bullying” foi editado pela Porto Editora, em parceria com a Confederação de Associações de Pais (Confap), e escrito por Allan L. Beane, pai de uma criança vítima de bullying, o que contribuiria para o stress pós-traumático de que sofreu. Este jovem acabaria por se refugiar no consumo de substâncias tóxicas, levando-o à morte.
O autor refere que, “quando uma criança é vítima de bullying, poderá ter medo de ir à escola. Poderá ficar doente no domingo à noite e enjoado na segunda-feira de manhã, só de pensar em ir para a escola e enfrentar os bullies [agressores]”. “Cada dia é um campo de minas social, podendo ocorrer vários acontecimentos desconhecidos e potencialmente perigosos, até que o dia chegue ao fim”, lê-se na obra de 240 páginas. Para o escritor, “qualquer conversa sobre suicídio deve ser levada a sério e merece atenção imediata”.
Em Portugal foi criado quase há dois anos o Portal do Bullying, que só no primeiro ano de actividade recebeu um total de 43.125 visitas, tendo a equipa de psicólogos que trabalha nesta plataforma dado 700 respostas. O portal possibilita a troca de e-mails, conversação online em tempo real e a troca de impressões e experiências num espaço de fórum. Do lado dos adolescentes o objectivo é obter esclarecimentos sobre a problemática e que diligências tomar. Já os pais querem saber mais sobre o bullying e como ajudar os filhos.
Apesar de tudo, de acordo com dados de 2010, Portugal é um dos países com menor incidência de riscos online para crianças e jovens, abaixo da média europeia (12%), diz o inquérito “Riscos e Segurança na Internet”, feito a mais de 23 mil crianças e jovens europeus entre os 9 a 16 anos e realizado pela equipa do projecto EU Kids Online.
Fonte: Público
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